Ato público denuncia riscos do mosquito transgênico para combater a dengue em Juazeiro (BA)

Por Áurea Olímpia, da AS-PTA   Foto: Francisco Valdean   Um ato público realizado na manhã desta segunda-feira (19), no Mercado do Produtor, em Juazeiro-BA, denunciou o uso de um mosquito Aedes aegypti geneticamente modificado, ou transgênico, que está sendo testado no município com o pretexto de combater a dengue. Um grupo de 50 pessoas, entre agricultores e agricultoras, técnicos e pesquisadores da área que estão participando do III Encontro Nacional de Agroecologia (ENA) distribuiu panfletos informativos com a população que circulava no mercado. Um balão gigante com o símbolo dos transgênicos e o desenho do mosquito foi colocado em cima de um carro de som, que acompanhou os manifestantes no local. De acordo com Gabriel Fernandes, assessor técnico da AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia e coordenador da Campanha Permanente Por um Brasil Livre de Transgênicos, o  nosso país é o único a liberar a produção comercial do mosquito geneticamente modificado, já testado no Panamá, Ilhas Caimã e Malásia. Ele explica que a proposta da empresa inglesa Oxitec, que detém a patente do mosquito, é produzir um Aedes aegypti geneticamente modificado e liberar espécies machos desse mosquito no meio ambiente, que então deveriam cruzar com fêmeas nativas. Segundo a empresa, desse cruzamento surgiria uma larva que supostamente não sobreviveria, eliminando assim o mosquito. “O problema é que, primeiro, eles partem da lógica que eliminar o mosquito é o mesmo que eliminar a doença e, segundo, que ao liberar os machos podem ser liberadas também espécies fêmeas, pois o controle não é 100%, essas estariam livres para se reproduzir e não temos como saber o risco de mutações genéticas e o desequilíbrio ambiental que isso pode gerar”, alerta Gabriel Fernandes. A produção comercial do mosquito foi autorizada no mês de abril deste ano pela Comissão Técnica Nacional de Biosegurança (CTNBio), instância colegiada que presta apoio técnico consultivo e assessoramento ao governo federal na formulação, atualização e implementação da Política Nacional de Biossegurança relativa a Organismos Geneticamente Modificados (OGM). José Maria Gusman Ferraz é biólogo, doutor em agroecologia e professor do mestrado em Agroecologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), ele integrava a CTNBio à época da liberação das pesquisas com o mosquito e veio, junto com um assessor da Comissão, as cidades de Juazeiro e Jacobina, municípios onde estão sendo testados o mosquito, analisar a situação. O especialista produziu um parecer técnico alertando sobre os riscos que constatou: “No parecer nós mostramos que havia de fato o escape de fêmeas, não estavam fazendo o levantamento sobre a redução da doença nem estudos sobre as áreas de esgoto a céu aberto Em Jacobina houve um aumento da doença, sendo decretado estado de calamidade pública. Quando reduzimos a população de uma espécie de mosquitos, outra espécie tende a ocupar o lugar, no caso a do Aedes albopictos, que transmite além da dengue, a malária e a febre amarela. O risco é que uma possível mutação do vírus gere uma doença ainda mais potente que a dengue ou que outras espécies de mosquitos sejam contaminadas pelo vírus da dengue”, afirma o especialista. Outra preocupação dos ecologistas é que não há segurança de que as larvas não sobrevivam, pois mesmo em condições ideais, 3% delas sobrevivem e a empresa que produz o mosquito sabe disso. Camilo Rodriguez é engenheiro químico e professor da Escuela de Ingeniería Universidad do Chile, ele pesquisa há quatro anos os efeitos da tetraciclina, um antibiótico largamente utilizado, principalmente pela indústria pecuária, que faz com que a larva do  Aedes aegypti  sobreviva. Segundo o estudioso, como o antibiótico pode estar no meio ambiente, a larva pode facilmente entrar em contato com essa substância. “É impossível fazer pesquisas independentes sobre esse assunto, pois o mosquito é patenteado pela empresa que produz toda a literatura que temos a respeito, isso por si só já deveria ser motivo de desconfiança”, diz. Em Juazeiro está instalada a empresa Moscamed, que tem um convênio com a Oxitec para a venda do mosquito. Apesar de há meses os mosquitos transgênicos estarem sendo liberados, a população desconhece o assunto. Márcia Faustino e Valdênia Almeida trabalham em um restaurante do Mercado do Produtor, as duas já tiveram vários casos de dengue na família e dizem que nunca ouviram falar do mosquito transgênico: “Eu to vendo só agora vocês falarem e vendo esse panfleto, mas nunca tinha ouvido falar e fiquei curiosa”, conta Márcia. De acordo com Gabriel Fernandes a Campanha vai acionar o Ministério Público para tentar barrar o uso do mosquito cuja eficiência não seja comprovada, além de seguir disseminando estas informações para o conjunto da sociedade e organizando mobilizações. O ato do mosquito transgênico faz parte de uma série de outras três mobilizações que aconteceram simultaneamente na manhã desta segunda-feira. Em Petrolina, mulheres estiveram no escritório da Embrapa Semiárido para entregar um documento pedindo a valorização da agricultura familiar em detrimento do agronegócio. Outro grupo se dirigiu à unidade de pesquisa da Monsanto, onde são feitos experimentos com milho e sorgo geneticamente modificados. Foram colocadas diversas cruzes na porta da empresa simbolizando as mortes provocadas pelos transgênicos e agrotóxicos da empresa. O III ENA, que termina hoje, conta com a participação de cerca de 2 mil pessoas, sendo a maioria agricultores e agricultoras de todos os estados do Brasil.

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